Bentinho, CR7 e a interpretação na comunicação atual
No livro Dom Casmurro, belíssima história de Machado de Assis, a relação entre Bentinho e Capitu ainda gera controvérsia mais de 1 século depois de lançada. Traiu ou não traiu? Cada leitor tem sua opinião, chegando ao ponto das diferentes visões gerarem estudos para cada uma das possíveis teorias. E o livro foi brilhantemente escrito para deixar essa conclusão no ar (ao menos é o que diz uma das perspectivas).
Interpretação é tudo! Isso vale para diferentes momentos da comunicação. É algo mutável, mesmo se colocado em cima de um mesmo tema. Depende da vivência, personalidade, repertório de quem está em contato com a mensagem, como no caso dos leitores do livro citado.
Com tanta informação e conteúdo gerados diariamente, a interpretação das mensagens se torna ainda mais determinante para o sucesso da comunicação. É interessante notar, por exemplo, como duas informações reais podem se juntar para formar outra que não necessariamente seja verdade, tudo por conta da interpretação.
Essa semana, nossa equipe estava comentando sobre o caso Coca Cola x Cristiano Ronaldo, que é um caso claro de informações reais que se conectam sem ter relação, como apontei acima. Não vou aprofundar nos acontecimentos, mas refletir sobre o desenrolar. Fatos: as ações da Coca Cola caíram (e já vinham caindo antes por conta dos movimentos do mercado, que não sou especialista para apurar) e o Cristiano Ronaldo retirou as embalagens do refrigerante da sua entrevista, colocando uma garrafa de água (e quem segue ele sabe que não deixa nem o filho beber refrigerante por conta da saúde física). Dois acontecimentos reais com seus caminhos individuais, sem estarem conectados até então. Parando para pensar, juntar as duas questões até que é uma história que faz sentido, não é algo surreal. Mas isso não é realidade, não existe conexão entre as duas coisas. Houve uma manipulação para criar isso. Isso é um prato cheio para o marketing e para a mídia, que precisa de mais cliques, que gera mais tráfego, que traz mais anúncios, que gera mais receita. Ufa!
Comparo isso com o caso da Taylor Swift e meu querido Corinthians: por mais que a fanfic seja tão legal, não ganhamos porque a cantora lançou álbum novo, apesar da gente (quase) sempre ganhar quando ela lança um álbum. Os dois também geram buzz. Juntos, torna-se a matéria ideal do clickbait.
Aquela imprensa que analisa, investiga, apura, confecciona o texto para publicar, hoje trabalha lado a lado e muitas vezes bancada por esse formato, digamos, sensacionalista.
Nós, do marketing, adoramos um cenário ideal (isso é provocação para outro texto): o enredo fica muito mais legal tendo o CR7 com influência a ponto de mudar tão rápida e bruscamente o mercado financeiro, que também não é tão sensível, e imaginando que a Taylor é um amuleto da Fiel. Só que não é bem assim que funciona. Precisamos ficar atentos: a interpretação é importante, imprevisível e tá solta, pronta para mudar qualquer mensagem. Até essa aqui.